O que W. Montgomery Watt disse sobre Muhammad?

Publicado em 05/02/2020

Muhammad (à direita) e outros Profetas retratados num manuscrito persa medieval.

W. Montgomery Watt
No final da sua biografia condensada sobre Muhammad (1), William Montgomery Watt se pergunta: "Foi Muhammad um Profeta?". Como o autor da biografia foi simultaneamente ministro anglicano e professor de Árabe e Estudos Islâmicos na Universidade de Edinburgh, além de autor de uma prestigiosa biografia sobre o Profeta publicada em dois volumes pela Universidade de Oxford; sua opinião é de suma importância para todos aqueles interessados no diálogo islamo-cristão. Assim começa o subcapítulo "Was Muhammad a Prophet?" (Foi Muhammad um Profeta?):

Emil Brunner
"Até aqui, Muhammad tem sido descrito a partir do ponto de vista do historiador. Entretanto, como fundador de uma religião mundial, ele também exige um julgamento teológico. Emil Brunner (importante teólogo calvinista da Suíça), por exemplo, considerando sua reivindicação de profeta, sustenta que 'não parece de forma alguma justificada pelo conteúdo atual das revelações', mas admite: 'se Mohammed tivesse sido um profeta pré-cristão da Arábia, não seria fácil excluí-lo das fileiras dos mensageiros que prepararam o caminho para a revelação'".

No original se encontra:

Primeiro volume
da biografia sobre
Muhammad
"So far Muhammad has been described from the point of view of the historian. Yet as the founder of a world-religion he also demands a theological judgement. Emil Brunner, for example, considers his claim to be a prophet, holds that it 'does not seem to be in any way justified by the actual content of the revelations', but admits that, 'had Mohammed been a pre-Christian prophet of Arabia, it would not be easy to exclude him from the ranks of the messengers who prepared the way for the revelation"

Watt, em seguida, afirma que não pretende entrar nas complexidades teológicas que sustentam a visão de Brunner: elas se encontram no livro Revelation and Reason.

A opinião pessoal de Watt se encontra resumida no seguinte parágrafo:

Segundo volume
"Finalmente, e a nossa questão? Foi Muhammad um profeta? Ele foi um homem em que a imaginação criativa trabalhou em níveis profundos e produziu ideias relevantes para a questão central da existência humana, de tal forma que sua religião teve um apelo universal, não apenas em sua época, mas também nos séculos seguintes. Nem todas as ideias que ele proclamou são verdadeiras e confiáveis, mas, pela graça de Deus, ele foi capaz de prover a milhões de homens uma religião melhor do que aquela que eles tinham antes de testemunharem que não há outro deus além de Deus e que Muhammad é o mensageiro de Deus."

No original:

Biografia
condensada
"Finally, what of our question? Was Muhammad a prophet? He was a man in whom creative imagination worked at deep levels and produced ideas relevant to the central question of human existence, so that his religion has had a widespread appeal, not only in his own age but in succeding centuries. Not all the ideias he proclaimed are true and sound, but by God's grace he has been enabled to provide millions of men wiht a better religion than they had before they testified that there is no god but God and that Muhammad is the messenger of God."

Montgomery Watt afirma, no entanto, que a maioria das ideias de Muhammad é verdadeira e confiável (pág. 239). Em relação ao caráter do Profeta, Watt afirma que ele foi "notavelmente livre de orgulho". O que é espantoso, visto que qualquer ser humano, convencido de ter recebido um chamado de Deus para desempenhar uma tarefa especial, sentiria algo a mais do que um pouco de orgulho (pág. 240).

Montgomery Watt sendo entrevistado
O autor encerra o subcapítulo sem oferecer uma resposta cabal para a sua pergunta inicial. No entanto, em seus últimos trabalhos (mais especificamente, em: Muhammad’s Mecca: History in the Qurʾan) (2), Watt declara abertamente que Muhammad deveria ser positivamente comparado aos Profetas do Antigo Testamento e que o Alcorão foi divinamente impresso na consciência do Profeta. Ele conclui: "Eu acredito que Muhammad foi verdadeiramente um profeta, e eu acredito que os cristãos deveriam admitir isto com base no princípio cristão de que: 'pelos frutos conhecereis'"

Certamente, aceitar Muhammad como Profeta é assumir uma posição extremamente problemática para a teologia cristã. As diferentes confissões cristãs concordam que a revelação de Deus à humanidade terminou com os Apóstolos. Além disso, existem contradições entre crenças fundamentais da fé cristã (Trindade, Encarnação, Crucifixão, Sacrifício Vicário etc.) e a mensagem corânica. Apesar disso, alguns teólogos cristãos (tais como: Hans Küng, Georges Khodr, Kenneth Cragg; dentre outros) têm se dedicado a "construir pontes" entre as duas grandes religiões mundiais.

(1) W. Montgomery Watt. Muhammad: Prophet and Statesman. London: Oxford University Press, 1961. Pág. 237, 238, 239, 240. Disponível em: https://archive.org/

(2) F. Peter Ford, Jr. “He Walked in the Path of the Prophets”: Modern Christian Perspectives on Patriarch Timothy’s View of the Prophet of Islam. Theological Review, 36, 2015, pp. 3-22. Disponível em: https://www.academia.edu/

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